A Cruz e o jovem. Sinal da escolha por Cristo

Atenção: essa postagem deve ser meditada nas fraternidades cristãs. É a nossa formação trimestral, tal qual está prevista em nossa disciplina anual.


Alguns podem pensar se, nos dias de hoje, seria apropriado falar de cruz ou de provação para os jovens. Realmente, a juventude do nosso tempo parece não estar disposta a ouvir um convite ao seguimento de Cristo que fale sobre a cruz e sobre sacrifícios. Por isso, muitos caem no engano de querer passar um Evangelho “light” para os jovens, sem “radicalismos”, com medo de espantá-los... Que engano! Mal sabem que o que afasta os jovens do Senhor é a mediocridade, é justamente esta falta de radicalidade. Também não é correto aplicar um fundamentalismo irracional, mas é preciso passar aos jovens um anúncio explícito e integral do Evangelho.

Como sabiamente nos ensinou o papa dos jovens, João Paulo II: “A juventude do nosso tempo sente fortemente a atração pelas alturas, pelas coisas desafiadoras, pelos grandes ideais. Se transmitirmos aos jovens, sem cortes ou falsos pudores, os grandes valores do Evangelho, eles estarão prontos a responder”. O jovem e a cruz não são opostos e, mesmo se fossem, poderíamos afirmar, mais do que nunca, que os opostos se atraem.

A cruz foi confiada à juventude pelo papa João Paulo II, por isso, hoje, simbolicamente, vários jovens levam uma enorme cruz de madeira na Semana Santa e durante as jornadas mundiais da juventude. O papa reconhecia nos jovens o vigor necessário para sustentar a cruz.

Podemos também dizer que a juventude espiritual é condição necessária para carregar a cruz. Os santos e mártires, quando carregaram suas cruzes (perseguições, calúnias, doenças e morte), estavam na “flor da idade” espiritual.

João Paulo II, durante um encontro com os jovens, já com a saúde debilitada pela idade, exclamou: “Sou um jovem de 83 anos!”. Essa é a juventude que não depende da idade... Alguns dizem que a juventude não é uma fase da vida, mas um estado da alma. Uma alma que se encontra envelhecida não consegue mais ver sentido na cruz, não a vê com esperança.

Nas Sagradas Escrituras, São João, o discípulo mais jovem, escreve-nos em sua primeira carta: “Jovens, vós sois fortes, a Palavra de Deus permanece em vós e vencestes o maligno”. Essa passagem é muito significativa para compreendermos melhor o motivo pelo qual o Papa confiou a cruz à juventude.

O jovem, apesar de todos os flagelos que o assolam no nosso tempo (materialismo, hedonismo, permissivismo, promiscuidade sexual, etc.), é dotado de um espírito que está sempre a buscar o transcendente, a buscar emoções novas e algo pelo qual lutar. Essas características o capacitam a encarar a cruz com um olhar confiante e cheio de esperança.

Manifestação nas dificuldades

Afinal, o que é essa cruz? Como foi dito sobre os santos, a cruz pode se revelar a nós através das perseguições que sofremos, doenças, lutas pessoais e até mesmo da morte. A cruz pode ter essas ou várias outras faces. Mas o certo é que a cruz sempre estará presente na vida daqueles que optam por seguir Jesus, pois Ele mesmo associa diretamente o seu seguimento com a cruz quando diz: “Aquele que quiser seguir-me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mt 16,24).

Queremos seguir o Senhor, mas não queremos tomar nossa cruz. Diz-nos São Francisco, o pobre de Assis: “Os que não sabem do Crucificado não sabem nada do Ressuscitado. Os que não falam do Crucificado também não podem falar do Ressuscitado. Os que não passam pela sexta-feira da Paixão nunca vão chegar ao domingo da Ressurreição”. Na nossa vocação, chamamos Jesus de o Ressuscitado que passou pela cruz. Ele ressuscitou, mas, para que isso acontecesse, teve antes que morrer no lenho da cruz. São duas realidades que não podemos separar.

O jovem (e todo homem) deve entender que toda cruz é portadora de um potencial redentor, diz-se potencial pois ela pode redimir, mas não necessariamente cumprirá seu papel salvífico se não soubermos carregá-la. Dessa forma, vamos tornando-a motivo de desespero, murmuração e desconfiança em Deus. Porém, se todo o potencial redentor, purificante e libertador da provação for bem vivido através do abandono em Deus, da paciência e do oferecimento do sofrimento que passamos como sacrifício, a cruz será porta para o céu.

Sacrifícios de cruz

Quando um jovem se decide pelo seguimento de Cristo, muitas situações desafiantes se apresentem como sacrifício de cruz: a objeção da família, a rejeição dos amigos, as tentações do pecado e a própria sociedade, que de todas as formas tentam tirar Deus do coração das pessoas, sendo os jovens seus maiores alvos.

Os jovens são muito atingidos, pois o demônio sabe qual seria o poder de uma geração de jovens santos no seguimento de Cristo, que impacto isso seria para o mundo. “O terceiro milênio aguarda a contribuição da fé e da inventiva de uma multidão de jovens consagrados, para que o mundo se torne mais sereno e capaz de acolher a Deus e, nele, todos os seus filhos e filhas”. Diz-nos João Paulo II em sua exortação vita consecrata.

Para viver a cruz é preciso antes contemplá-la. Ela sempre irá nos remeter à palavra sacrifício, palavra essa tão obsoleta para o mundo atualmente. O sacrifício vivido como cruz, ou seja, unido ao sacrifício de Cristo, é um crivo, uma peneira que retira os excessos. É como uma fornalha que vai purificando e nos fazendo ficar somente com o essencial.

A cruz nos faz ter o olhar voltado somente para Deus. Pela falta de um olhar sobrenatural, não entendemos o nosso sofrimento e o sofrimento do homem. Somente vamos entender o sofrimento, que é sempre presente na existência humana, se partirmos da contemplação do sofrimento de Cristo.

É importante também saber que não somos chamados a entender tudo, a saber o motivo das provações pelas quais passamos. Haverá muitas situações em que só nos restará nos curvarmos diante do mistério do sofrimento e esperarmos no Senhor. Talvez seja por isso que Deus permite o sofrimento, pois Ele sabe que a dor pode dobrar o mais duro e indiferente dos corações. Se não passarmos pelas provações, não poderemos dizer como Jó: “Te conhecia Senhor, somente em palavras, mas hoje meus olhos te viram”.

Por fim, é bom lembrarmos que Deus Pai escolheu uma jovem para ser a mãe de seu Filho. O Senhor confiou a mais alta missão que poderia ser dada a um ser humano a uma adolescente. Maria, na sua juventude, tinha em seu coração os anseios típicos de todos os jovens, seja qual for a época na qual estejam inseridos, tais como a busca pela felicidade, pelo amor verdadeiro, pelo sentido último da existência e por viver a vida em sua plenitude. A diferença é que para suprir esses anseios ela não buscava grandezas, mas buscava somente a grandeza que é Deus, que é a santidade. Maria foi-nos dada como mãe quando estava aos pés da cruz de seu filho, quando Jesus a confiou a João, o mais jovem dos apóstolos, o discípulo amado, que certamente só conseguiu estar aos pés da cruz pois estava ao lado de Maria. Recorramos sempre à Mãe de Deus, e que ao lado dela possamos contemplar a face do verdadeiro amor, deste amor que tanto buscamos em nossa juventude: o Cristo Crucificado!


Daniel Chagas
Missionário da Comunidade Católica Shalom



Fonte: Com. Shalom