Jesus ressuscitado apareceu aos discípulos e lhes deu uma ordem: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). Deu-lhes essa ordem porque tinha consciência do grau de amizade que havia entre eles, sabia que sua pessoa e sua mensagem estavam impregnadas de forma profunda no coração – fonte central de onde emanam as decisões, os impulsos desinteressados do amor – dos seus discípulos.
Diante da recomendação incisiva de Jesus, os discípulos decidiram com mais radicalidade dar uma resposta concreta, com a própria vida ofertada em testemunho da pessoa admirável, apaixonante, sedutora de Cristo, o único capaz de fazer o homem verdadeiramente feliz.
Ardia dentro deles uma brasa que se transformava em chama vida, em sede de Deus, que nunca os deixava em paz, como a sarça ardente que sempre ardia e nunca se consumia. Uma sede enigmática que, quanto mais saciava, mais insaciável se tornava. É certo que, só um coração deslumbrado, seduzido pelo Altíssimo, não se reduz a alguns esquemas mentais, porções de palavras, lógicas e especulações humanas que emergem da pobre visão que se tem de Deus: um deus que não queima, não refresca, não alimenta, não estremece, não seduz; é uma idéia, uma teoria, um deus que não é o Deus vivo.
Hoje, também o Papa nos conclama a “lançarmos as redes”, tornarmo-nos “pescadores de homens” para levá-los à fonte da felicidade, que é o próprio Cristo. Mas para desempenharmos esta missão é necessário termos um coração apaixonado.
São estas as palavras do nosso pastor: “É preciso reacender em nós o zelo das origens, deixando-nos invadir pelo ardor da pregação apostólica que se seguiu ao Pentecostes. Devemos reviver em nós o sentimento ardente de Paulo que o levava a exclamar: ‘Ai de mim se não evangelizar’.” (No Início do Novo Milênio).
Só quem tem um coração apaixonado – como o de Paulo, que tudo perdeu, enfrentou tempestade, correu risco de vida, consumiu a vida por Cristo e, movido por sua graça, partiu, serviu, dispôs-se a tudo, sem cálculos ou reservas, por amor a Deus e aos que sofrem, por paixão a Cristo e aos homens, paixão esta que desemboca em missionariedade – é inflamado pela pessoa de Cristo e por sua mensagem de paz e de amor e contagia outras pessoas.
Diz ainda o Papa: “É preciso um novo ímpeto apostólico, vivido como compromisso diário das comunidades e grupos cristãos... Cristo há de ser proposto a todos com confiança. A proposta deve ser feita aos adultos, às famílias, aos jovens, às crianças, sem nunca esconder as exigências mais radicais da mensagem evangélica, mas adaptando-a, quanto à sensibilidade e à linguagem, à situação de cada um, segundo o exemplo de Paulo, que afirmava: ‘Fiz-me tudo para todos, para salvar alguns a todo custo’.” (No Início do Novo Milênio).
Só quem teve uma experiência real com Jesus é capaz de ser sua testemunha, e nós sabemos que milhares e milhares de pessoas, no mundo inteiro, tiveram essa experiência, foram agraciadas pela ação poderosa, forte e transformadora do Espírito Santo, experimentaram o amor infinito e profundo Deus, capaz de tudo pelo homem, por cada homem.
O encontro com Jesus nos leva a experimentar concretamente a cura da alma, do coração e do corpo. É uma experiência de liberdade que produz inevitavelmente a felicidade, perdoamos, amamos nossos inimigos, amamos a Igreja e nos comprometemos com ela, com a comunidade a que pertencemos; louvamos sem cessar, mesmo nas tempestades; queremos permanecer por horas infindáveis na presença do nosso Amado, conhecer sua Palavra e sua Mãe com mais intimidade; sentimo-nos irmãos de todos, amamos a todos sem distinção de raça, cor, classe social, cultura...
As colunas do nosso “eu” se derretem na fornalha do amor. Somos mergulhados na morte de Cristo e com Ele ressuscitamos. A nossa história – passado, presente e futuro – muda quando experimentamos o amor de Deus, quando o Pai emerge do mais profundo do nosso coração com um olhar amoroso, envolvendo-nos com um amor sem medidas... Diante de tudo isso, só nos resta permanecer imóveis, paralisados, vazios de tudo.
Tendo provado dessa experiência, não podemos retê-la para nós mesmos. Somos impulsionados a partilhá-la, a divulgá-la, a partir em direção aos irmãos para falar de Jesus e do que Ele pode fazer por nós, ministrar o shalom do Pai ao mundo. É urgente a evangelização, principalmente nestes tempos em que a paz está tão ameaçada. Evangelizar é anunciar a paz. Jesus é o Príncipe da Paz, Ele veio trazer a reconciliação dos homens com Deus, e dos homens entre si. É preciso ministrar a graça da salvação que inunda todo o nosso ser e nos faz criaturas novas.
Um dos maiores serviços de promoção humana é a evangelização. O encontro com Jesus resgata a excelência da dignidade humana, coloca o homem em harmonia com Deus, tira-o do vale da mentira que o seduz e o coloca no cume da montanha da verdade.
Não existe experiência melhor na vida de um homem do que ser evangelizado. Deus preenche o vazio do nosso coração dolorido, machucado, muitas vezes exilado em terras distantes da caridade, da misericórdia de Deus.
Evangelizar é assumir uma causa com todo o coração, é colocar-se ao inteiro dispor para ser instrumento do amor de Deus. É ser ponte sobre o abismo aterrador que existe entre os homens que estão longe de Deus. É ser canal da presença pura e essencial, amante, envolvente, onipresente de Deus. Essência da existência e fundamento do ser do homem.
Era o que sentia e expressava São Francisco de Assis: “Meu Deus e meu tudo!”, é a maravilhosa graça de ser “porta” para os homens passarem para Deus, para o vasto oceano do seu amor, do qual já se provou. É ser instrumento para retirar a poeira da confusão, do pecado e da dor. É muito mais do que cantar, pregar, escrever, pastorear, ensinar, rezar por cura, aconselhar, dançar, interceder, falar de Jesus... é dar a vida. É sofrer por amor.
Convém compreender que a palavra paixão encerra amor e dor. Foi isto que São Paulo viveu por Jesus e pelos homens, seus irmãos, uma paixão arrebatadora, que o deixava fora de si, por aquele que é enormidade, imensidão, eternidade, transcendente a si mesmo.
Só importava a São Paulo absorver Jesus e fazê-lo absorvido pelos seus irmãos, vivê-lo com a máxima potencialidade e fazer com que os outros, o maior número possível de homens, o vivessem assim também.
Evangelizar com o “ardor da pregação apostólica que se seguiu ao Pentecostes”, como nos conclama o Papa, é fazer Deus conhecido por todos os povos, é revelá-lo a eles. E deste conhecimento e revelação acontece a libertação do homem. É sermos mediadores da graça de salvação para o mundo. Ir ao encontro do menor irmão e ajudá-lo a conhecer a vontade de Deus.
O evangelizador cheio de ardor apostólico precisa se configurar a Jesus Cristo, ter os seus pensamentos, sentimentos, visão, dar a vida pelas ovelhas. Às vezes, enganamo-nos pensando que estamos dando a vida por Deus e pelos seus queridos, quando na verdade estamos dando a vida por nós mesmos. Deus está servindo apenas de palanque para aparecermos e buscarmos nossa glória. Por isso, o evangelizador precisa fazer-se pequeno e dedicar-se, entregar-se, empenhar-se consumindo-se pela salvação em Cristo Jesus de cada pessoa, de cada homem que lhe foi confiado. Por todos e por cada um.
Para evangelizar com ardor apostólico é preciso não dar satisfação ao próprio “eu”, não se justificar, esquecer-se, negar-se a si mesmo, não querer ter direitos, regalias, para que os outros tenham vida. A este evangelizador, o que poderá ofender? Nada! Nenhuma situação dolorosa ou imprevisível pode ferir ou desintegrar a estabilidade psíquica de um pobre de Deus que deseja anunciá-lo a todo custo.
O evangelizador deve repousar o seu olhar, como Jesus, sobre aquelas pessoas sofridas, cansadas, feridas, exaustas, desgastadas pelo mundo... Deve enxergar a necessidade de cada pessoa e tudo fazer para que ela experimente o amor, a caridade, a acolhida, o cuidado, a cura de seus males, o bom alimento que é Jesus Cristo. Somos chamados a ser um sinal de Cristo no meio dos irmãos, a ofertar a nossa vida em favor deles.
Ao olharmos para as pessoas e a situação em que hoje, infelizmente, muitas delas se encontram, percebemos que faltam operários para a messe, que é abundante. Faltam evangelizadores que se disponham a tudo, não meçam esforços, esqueçam seus problemas e suas feridas, esqueçam o seu descanso e velem sobre o rebanho do Senhor. O homem não descansará no instante em que morrer, mas a partir do momento em que passa a viver com Deus.
O evangelizador precisa colocar o coração naquilo que faz. Com o coração ofertado o homem convence, arrebata e apaixona outros. Incendeia os demais corações por Cristo quem põe o seu próprio coração a serviço dele. Somente um coração apaixonado é capaz de contagiar de amor outros corações.
Por isso, você, que agora lê este artigo, não hesite, siga os impulsos do seu coração. Não seja surdo ao amor, não se incline para a razão prescindindo do amor. O amor vem da fé, e a evangelização é fruto do amor.
Vá agora! Não espere! Não calcule! Não tenha medo! Não adote medidas ou cautelas. Tenha confiança, ponha-se a caminho, a serviço dos que precisam encontrar o amor de Deus, a liberdade de todo o seu ser. Abandone tudo o que prende ou obstaculariza você, porque só Deus vale a pena. Tudo é nada diante dele: estudos, trabalho, hobbys, diversões, expectativas, planos e ilusões...” Tome uma decisão, Ele o espera. Ele precisa de você. Ele o chama. Você colocou a mão no arado..., não olhe para trás, se o fizer, não é apto para o Reino (cf. Lc 9,62).
Ponha suas mãos nas mãos de Deus e se lance no imprevisível, sem medo. Vá decidido, sem pensar duas vezes. Doe sua vida a Deus e aos irmãos. Aja imediatamente. Vença o respeito humano, supere seus preconceitos. Evangelize com todo o seu coração, com toda a sua alma, com todas as suas forças! Muitos precisam de Deus, de paz, de amor. Mãos à obra, porque pouco ou nada fizemos. Por amor a Jesus, deixe seu coração vencer a razão!
- Germana Perdigão
Consagrada na Comunidade de Aliança Shalom
Fonte: www.comshalom.org